Qual a melhor porta de entrada para o mundo dos RPGs eletrônicos? Se você tivesse que sugerir um jogo para aquele conhecide que nunca jogou nenhum, qual seria?
Existem inúmeras respostas que datam desde algum jogo retrô até alguma iteração moderna. Porém, esses dias, eu e o Vini estávamos conversando sobre RPGs – como todos os outros dias – e chegamos a uma discussão de RPGs que apresentam sistemas complexos ou difíceis demais para indicar a iniciantes.
Por isso, resolvi fazer uma lista de RPGs mais antigos que possuem uma mecânica ou sistema muito complexo, ou que toda a sua execução exige um mestrado em game design. Entenda que não estou falando que são RPGs chatos ou tediosos, apenas que possuem um formato que exige um estudo prévio antes de iniciar suas aventuras por aquele mundo mágico e que talvez não seja a melhor sugestão de jogo para um iniciante em RPGs. A não ser que sua intenção seja traumatizar a outra pessoa para o resto da vida e fazê-la jogar só Call of Duty.
Lembrando que a maioria desses RPGs eu joguei em uma época onde guias na internet não eram tão predominantes assim, o que tornava o processo de aprendizado uma tarefa mais árdua do que nos tempos modernos pós-dominação-do-ChatGPT.
Final Fantasy VIII

Se você é veterano de Final Fantasy VIII, sabe todos os macetes de como usar o Card Mod do Quetzacoatl pra quebrar o jogo na primeira hora, então isso não se aplica a você.
O que vou falar é como o sistema de Junction e Draw do FFVIII pega qualquer novato, ou mesmo uma galera que jogou um punhado de outros RPGs, desprevenido. Ainda mais porque o tutorial dessa mecânica tá no PC pessoal na sala de aula do Squall, um objeto que poucos irão interagir.
E convenhamos, o sistema de Junction e Draw é bem confuso. Para quem não conhece, FFVIII lhe permite equipar Guardian Forces, que são as invocações do jogo. Ao equipá-las, elas permitem alocar magias em certos atributos dos personagens, os fortalecendo.
Para adquirir magias precisamos usar o comando Draw nos inimigos em batalha, num processo longo e tedioso. A questão aqui é que quanto mais magias tivermos no estoque, com o máximo de 100, maior será nosso atributo, enquanto algumas magias específicas são melhor alocadas em certos status, como por exemplo uma magia de Cura no HP. Só que todo esse processo de ficar continuamente fazendo Draw em batalhas é muito contra-intuitivo.
Uma batalha que deveria demorar 20 segundos acaba se estendendo por tediosos 5 minutos enquanto nossos personagens repetem o mesmo processo. Quem é novo no FFVIII não imagina que precisa ficar lá, usando o mesmo comando repetidamente, para estocar magia e se fortalecer.
Por mais que uma vez que você aprenda como funciona o Junction e o Draw você nunca mais esquece, chegar até esse aprendizado, ainda mais na época sem guias ou amigos para te ajudar, era bem complicado.
Vagrant Story

Quem nunca jogou Vagrant Story e chegou num boss tirando 1 de dano que jogue a primeira magicite.
Vagrant Story tem um sistema de combate baseado em inputs. Cada vez que você acerta o timing correto do botão, Ashley Riot continua atacando o inimigo. Só que conforme o combo aumenta, também cresce a barra de Risco do personagem, aumentando o dano causado, como também o dano tomado, e diminuindo a chance de acertar um ataque.
Só que tirando o manual do jogo, não tem quase nenhuma documentação que explique como funcione o sistema de batalha, que nem mesmo o próprio Matsuno soube explicar a qual gênero pertence.
Enquanto exploramos as masmorras de Vagrant Story, apertar o botão faz uma esfera de alvo aparecer ao redor de Ashley. Se um inimigo estiver ao alcance, ele e suas partes podem ser atacadas. Enquanto decidimos onde atacar, o jogo nos informa qual a chance de acerto e o dano causado, bem semelhante aos antigos jogos do Matsuno como Tactics Ogre e Final Fantasy Tactics.
Mas repentinamente, o dano que causamos começa a diminuir e o dano que tomamos não para de subir. Isso porque há diferentes tipos de armas que funcionam contra diferentes tipos de inimigos. Ao mesmo tempo, há um sistema de classe e quanto mais usamos uma arma contra um inimigo, mais forte ela fica contra aquele inimigo MESMO que ele seja resistente contra o tipo de arma.
Deu pra entender a loucura? Aí tem também atributos elementais, chain attacks, o sistema de break e magia e outras características que influenciam muito o combate. Eu não vou nem entrar no mérito de criação de armas porque senão esse vídeo vira uma monografia de Vagrant Story.
Resumindo: use um guia se possível. Vagrant Story é maravilhoso, mas fique ciente de que o jogo não tem uns sistemas muito intuitivos e vai acabar dando dor de cabeça aos desavisados.
Baldur’s Gate 1

Galera, estou falando aqui do Baldur’s Gate 1, talvez o 2. Não confundir com o Baldur’s Gate 3 que apesar de complexo, é muito mais amigável que seus antecessores.
A primeira vez que joguei BG1 foi quando eu tinha 14 anos e troquei meu deck de magic pelos 5 CDs do jogo no PC. Criei um personagem, joguei por 30 minutos, não entendi nada e desisti. Mais tarde, fui tentar novamente, cheguei até as minas, morri pra cacete e desisti novamente. Agora, mais velho, foi questão de honra. Eu queria entender e apreciar o que é considerado um dos melhores e mais influentes CRPGs do mundo. Hoje eu tenho até uma platina dele.
E olha, eu não sou expert nas regras em RPG de mesa, mas BG1 segue tudo à risca as antigas versões de D&D, mesmo que isso comprometa a sanidade do jogador. Se tem uma coisa que eu sei quanto essas versões passadas é que a regra de Armor Class era uma das mecânicas mais complexas já feitas, junto daquela loucura de THAC0, que significa to hit armor class 0. Nas nossas versões do D&D, eles alteraram isso pra ficar algo mais óbvio. Mas antigamente, e na época do Baldur’s Gate 1? Que isso. Atualmente, Armor class funciona como sempre deveria ser: quanto maior o seu valor de armor class, menos dano você leva.
Só que em Baldur’s Gate 1, na versão original e na aprimorada, o AC era o oposto. Quanto MENOR fosse, melhor era sua defesa. E ainda assim não era algo tão direto e reto. Tinha muitos cálculos envolvidos que virgem maria… eu só equipava o que me parecia ser melhor e ia embora.
Aliás, o combate de tempo real com pausa não é flor que se cheire também. Acho que é meu combate menos preferido do mundo de RPGs. Quantas vezes eu não ficava pausando, tentando alinhar meus personagens pra ficar longe do fogo cruzado, e quando eu usava bafo de fogo com o Ryu, meu curandeiro pulava na frente dele pra pegar um bronze e se carbonizava até a morte. O que eu fiz de quick save e quick load nesse jogo não tá escrito. BG1 é definitivamente um RPG que eu não recomendaria para um iniciante no gênero.
The Last Remnant

Outro jogo que eu já iniciei umas 5x, mas nunca consegui sair das horas iniciais. The Last Remnant é bem bonito, ainda mais em 2008 pro Xbox 360. Mas por algum motivo, eu sempre acabo me desinteressando dele. Talvez porque ele seja um jogo da franquia SaGa disfarçado com outro nome.
Digo isso porque veteranos da franquia SaGa trabalharam no The Last Remnant, como o próprio criador de SaGa, o Akitoshi Kawazu. Dá pra ver a influência deles no sistema de combate, que possui uma execução meio aleatória, um sistema de aprender novas habilidades durante a batalha, o crescimento de atributos isolados de personagens ao invés de nível e até aquela desgraça de mecânica chamada de Battle Rank, onde inimigos evoluem conforme você se envolve em mais combates.
The Last Remnant tem um sistema de combate por turnos dividido por esquadrões. Ao invés de escolhermos um só personagem, nós escolhemos um líder e esse é o líder de uma união de até 5 personagens e podemos levar também 5 uniões ao combate. Só que ao invés de escolhermos as habilidades de cada personagem independentemente, nós escolhemos um comando que às vezes não indica nada. Então, por exemplo, se escolhermos o comando “atacar” é auto explicativo. Se escolhermos algo como “atacar com artes de combate ou artes místicas” os personagens da união que possuem uma arte deverão, teoricamente, usar uma arte aleatória correspondente.
Só que isso vai mudando conforme a batalha progride. Tem uma barra de moral no meio do combate, que pende pro lado dos aliados ou dos inimigos dependendo de quem estiver causando mais estrago. Quando uma união cruza com outra, eles entram num deadlock e não podem sair da treta até uma morrer. Se por acaso outra união entrar na briga, ela flanqueia o inimigo, adicionando moral pro time que flanqueou e dando uma vantagem enorme nessa briga que agora se tornou 2 contra 1.
A questão é: se por acaso você começar a perder uma batalha, é incrivelmente difícil reverter o jogo. A moral dos aliados fica baixa, começamos a ganhar menos AP e somos interrompidos com mais frequência, e o que nos resta, é a morte. Da mesma forma, caso sobrepujamos o inimigo, a vitória é quase garantida.
Há também alguns elementos de timing no meio da batalha que melhoram o ataque ou a defesa, mas é bem dificinho de acertar. Quem sabe um dia eu não me arrisque novamente, porque sempre fiquei interessado na história de The Last Remnant.
Unlimited SaGa

Tudo nesse jogo é complexo, especialmente o ato de começar a jogar ele porque meu amigo. Quem vê as reviews do canal sabe que eu sou meio bundão e raramente falo mal de um jogo. Mas cara, Unlimited SaGa é o RPG que eu mais detesto na vida.
Tenho uma relação conturbada com a série SaGa porque ela, por si só, já é bem complicada. Mas Unlimited elevou a esquisitice da franquia a um novo nível que me dá até úlcera só falar dele.
Qualquer atividade que você faz em Unlimited SaGa, QUALQUER uma, é super onerosa e xarope. Começamos o jogo escolhendo um protagonista, que logo é introduzido numa esquete de imagens estáticas. Depois, o jogo nos joga ao cenário de jogabilidade, que é semelhante a um tabuleiro.
Dependendo do personagem e da sua evolução, podemos ter diversas habilidades tanto pra usar no campo como em batalha. Por exemplo, um personagem com a habilidade Guia de Estrada consegue ativá-la no campo pra ver o que tem na região. Um com habilidade de Chaveiro pode conseguir abrir um baú e outro personagem com habilidade de diplomacia pode evitar batalha com monstros.
Tudo isso parece muito interessante em teoria. EM TEORIA. Porque na prática é um pesadelo. É preciso navegar por 10 etapas no menu para ativar cada habilidade. Sempre que tentamos fazer algo, aparece uma roleta, com 2 chances de acertarmos a habilidade, 8 de errarmos e 87 de cairmos numa armadilha e quase matar nossos personagens.
O jogo está a todo momento querendo TE FODEEEEER. Unlimited SaGa não quer que você jogue e se divirta, ele quer que você se contorça e sofra pra se alimentar dos seus sentimentos mais negativos e sujos. Até na batalha, que tem uma trilha sonora maravilhosa, não é garantido usar uma habilidade de combate do personagem, porque aquela MALDIATA roleta entra no caminho de novo.
Uma vez eu fui numa quest, fiquei quase 1h nela, do nada um membro do meu grupo caiu num buraco, ele ficou sozinho no mapa, enfrentando monstros fodas pacas e até conseguir voltar pro grupo principal já era game over e eu perdi 1h de progresso, porque jogo de PS2 só tem save na cidade, né?
Gente, sério. Eu adoraria que todo mundo jogasse 15 minutos de Unlimited SaGa pra vocês começarem a valorizar todos os outros jogos que vocês têm ainda mais.
Legend of Mana

Legend of Mana é um tesouro de jogo. Fofinho, bonito, carismático, trilha sonora impecável, um abraço quentinho no mundo dos games. Até você começar a brincar de Lego com o mundo e ter que vender lanternas pra bicho que só fala duba bubu dubaababa bada.
Brincadeiras à parte, o jogo em si não é complexo, mas ele possui algumas mecânicas que não se explicam muito bem, como a de criação de itens. O combate também tem algumas complexidades a mais. Se você quiser aprender todas as habilidades ou técnicas com arma, saiba que o jogo possui um sistema de valores escondido que contabiliza cada vez que você usa a arma, o que pode te conferir uma nova habilidade ao fim da batalha. Só que não quero me aprofundar nessas, quero falar do layout do mundo.
Legend of Mana apresenta artefatos, que são itens distribuídos no mapa do mundo. Ao serem colocados, eles criam uma região nova, seja uma cidade ou dungeon. Se você for jogar o game apenas para zerar, tudo bem, não precisa pensar em nada. Mas se você quiser fazer tudo, habilitar quests e aproveitar o que o jogo tem a oferecer, CADA posição, elemento e layout dessas regiões vão impactar o seu jogo.
Sempre que coloca um artefato, ele tem um land power e um atributo elemental. Se o guia que eu vi está correto, um artefato já colocado absorve o elemento de um novo artefato adjacente a esse, o que pode implicar em mudanças e aparições de quests, materiais e pets.
Além disso, para resumir, quanto mais longe do seu Lar estiver uma região, maior será o nível dela e, por consequência, dos monstros, o que também implica em mudanças de monstros, pets etc. Enfim, essa organização de artefatos e novos terrenos e o que sua ordenação libera é algo praticamente impossível de desvendar por conta própria. Hoje em dia há vários guias com layout do mapa que te ajudam, mas antigamente? Nem Mãe Dinah conseguia. É um sistema deveras complexo, mas certamente bem criativo.
Conclusão
Essa foi uma lista de alguns RPGs que possuem mecânicas complexas ou sistemas obtusos. Menção honrosa aqui para RPGs que exigem alguns requisitos cabulosos para conseguir o final verdadeiro, como Valkyrie Profile e Suikoden, e é quase impossível conseguir sem usar um guia. O Vini comentou que o combate de Resonance of Fate também tem um esquema extremamente confuso e difícil de entender, mas como eu não joguei ele, não coloquei na lista.

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